Sem fórmulas mágicas
Receita de bolo precisa ser seguida à risca. Já a carne de panela da sua mãe pode ser reproduzida no seu lar com adaptações ao gosto do freguês. É uma regra: não se muda receita de doce; já com os pratos salgados, é possível brincar um pouco mais, ser um chef de cozinha com menos amarras. Receita serve para orientar, indicar um caminho sem muitos erros. Mas é contra-indicada em muitas situações. Não existem fórmulas mágicas para decorar a casa, por exemplo. Pode reparar da próxima vez que você gostar muito da casa de alguém – que pode ser de um amigo ou escolhida aleatoriamente nas páginas de alguma revista. Geralmente as que despertam amores instantâneos são aquelas que se parecem muito com os moradores. Casas com personalidade marcada em cada detalhe. Na maneira de pendurar os quadros na parede, nas cores, no tipo de tapete, nas formas do sofá da sala... Como ter uma casa de personalidade?, você pode perguntar. Não existe fórmula pronta, nem bula indicando dosagens e modos de usar. Para chegar a esse ideal, é preciso vasculhar dentro de você quais são as imagens, objetos e cores que inspiram seu modo de vida. Dá trabalho, é verdade. Mas são nessas viagens que se descobrem os segredos mais belos. Tem gente que passa a vida sem coragem para descobrir os próprios desejos. Perdendo, assim, não só a oportunidade de novas leituras da realidade cotidiana como também os extras que aparecem entre uma busca interna e outra. Visitei certo dia uma dessas casas inspiradoras, que têm a cara dos donos. Entre a apresentação de um objeto especial e outro nas mesinhas da sala; depois de explicar detalhadamente a escolha dos móveis, a dona da casa me confessou ter apreço especial por quadros com imagens de mulheres parecidas fisicamente com ela. Observei cuidadosamente cada um deles e não houve maneira de encontrar a moça de carne e osso nas diversas pinturas espalhadas pela casa. Eram todas mulheres muito bonitas, como ela, mas com características diversas. Para ela, porém, enxergar um elemento comum entre as peças daquela coleção fazia muito sentido. Uma fórmula mágica que só funcionava com o filtro do seu olhar. Ela estava apenas decorando a casa, mas certamente descobriu coisas muito importantes sobre ela mesma. A ponto de ter espalhado as provas, bem visíveis, por todas as paredes da casa. Talvez um lembrete para seguir vasculhando os próprios pensamentos sempre, mesmo que, na prática, seja apenas para descobrir uma cor nova para as paredes.